Federico Nogara entrevista a Aricy Curvello

La literatura latinoamericana se podría dividir en cuatro grandes bloques: la andina, la del Río de la Plata, la brasileña y la del Caribe. Las cuatro se influencian y se desconocen. ¿Podrías hacernos una breve reseña de los autores que consideras esenciales para explicar la literatura brasileña?

Conforme postula um de nossos  maiores estudiosos, o Prof. Antônio Cândido (Universidade de São Paulo), ainda que possa contar com alguns precursores de algum gênio (Gregório de Matos, o “Boca do Inferno”, no séc. XVII, por exemplo), a literatura brasileira realmente iniciou-se com os poetas mineiros do século XVIII ligados à Inconfidência  Mineira, uma das primeiras e mais sérias tentativas de libertar do domínio português o nosso país. Tais poetas árcades conseguiram exprimir algo de nossa paisagem exterior e interior, porisso ainda nos falam (Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto, Cláudio Manuel da Costa, este “suicidado” na prisão), afora terem sido presos, processados e exilados para a África. O nosso conto, o  nosso romance, a crônica, o teatro bem como a crítica nasceram com o Romantismo (séc. XIX), cujos expoentes são Machado de Assis e José de Alencar, juntamente com os poetas Gonçalves Dias e Álvares de Azevedo. Machado superou-se e ultrapassou mesmo o Realismo que nos deu duas grandes figuras, Raul Pompéia (o romance “O Ateneu”) e Adolfo Caminha (os romances “A Normalista” e “O Bom Crioulo”). O Simbolismo entre nós teve pálida expressão, pois o Parnasianismo de extração francesa empolgou os poetas no final do século XIX e nos inícios do século XX, cuja maior expressão foi Olavo Bilac. A riqueza produzida pela agricultura intensiva em São Paulo possibilitou a urbanização e a industrialização bem como a nova estética que teve como rótulo Modernismo.  Os autores do Modernismo (1922-1945) tornam-se os primeiros escritores modernos do Brasil em prosa e em poesia, em São Paulo, Rio e Minas Gerais. Em  1930 é lançado o primeiro livro (“Alguma Poesia”) do hoje poeta máximo brasileiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).

O ano de 1928 marcou o surgimento de“ A Bagaceira”, de José Américo de Almeida, que inaugurou o ciclo do romance do Nordeste, em que brilharão Graciliano Ramos (“Vidas Secas” e “Angústia”), Jorge Amado (“ Capitães d’ Areia”, “ Gabriela Cravo e Canela”, “Tieta do Agreste”,etc.), Rachel de Queiroz (“ O Quinze”), autores e livros que buscaram retratar a aspereza do homem e do solo crestados pela seca e pelo clima de deserto das caatingas.

Após a Segunda Guerra Mundial (1939-45) surgirão os dois máximos romancistas brasileiros do século, o  mineiro Guimarães Rosa (“Grande Sertão:Veredas”) e a ucraniana emigrada Clarice Lispector (“Perto do Coração Selvagem”, “A Maçã no Escuro”, etc.)

Dice la escritora y crítica literaria Cristina Peri Rossi en el prólogo de la edición en español del libro Silencio de Clarece Lispector: “Lispector es muy importante en la modernización de la literatura brasileña. (…) Hasta ella, en esa literatura predominaba lo narrativo sobre lo expresivo, era con frecuencia pintoresca, localista y demasiado atenta a la descripción de una realidad miserable, aunque ésta fuera compleja, dramática y contrastada”. ¿Estás de acuerdo con estos apuntes?

Não, não concordo. O maior ficcionista brasileiro de todos os tempos é Machado de Assis (1839-1908) e não há como reduzí-lo ao que generalizou a Peri Rossi. Não se aplica, também, a Raul Pompéia (1863- 1895) e a vários outros do século XIX. O romance psicológico brasileiro no século XX também  é anterior a Clarice:  basta ver a obra de Cornélio Pena (1896- 1958) e Lúcio Cardoso (1913-1968), entre outros. “Sagarana” (contos) de Guimarães Rosa é de 1937 (quando, inédito, o livro ganhou o 2º lugar no Prêmio Humberto de Campos) e publicado em 1946. Os elementos que a Peri Rossi mencionou como sendo predominantes na literatura brasileira antes de Clarice eram sim predominantes apenas no romance do Nordeste (vide Jorge Amado, o mais conhecido e o mais traduzido daqueles autores) e não em toda a literatura do país que é um continente e sobre o qual é extremamente perigoso generalizar, sem um estudo profundo de qualquer assunto.

Às vezes diz-se que o romance e o conto de Clarice Lispector devem ser enquadrados no realismo mágico  –  do qual a autora também não foi pioneira no Brasil. Talvez o mais apropriado fosse dizer que Clarice buscou uma linguagem de ficção que se completasse em si mesma e se bastasse a si mesma, utilizando também alguns recursos próprios ao realismo mágico.

 En cierta ocasión me dijiste que el surrealismo era ajeno a la literatura brasileña. ¿Podrías profundizar en ese concepto?

 O surrealismo é de primeira importância para a poesia hispano-americana. Não o é para a poesia brasileira e jamais logrou aceitação de nossos poetas e de nosso público, salvo pouquíssimas exceções (Murilo Mendes e uma parte da obra de Jorge de Lima, por exemplo). 

  Pasemos del Brasil a América Latina. Mucho se ha hablado de la  literatura latinoamericana. El crítico literario argentino Ricardo Piglia dice: “La aspiración a la unidad latinoamericana es una consigna que viene de las guerras de Independencia y es muy legítima. (…) Yo creo que deberíamos mantener la categoría de lo “latinoamericano”, obviamente porque somos latinoamericanos y pensamos que esa tradición y ese campo de estudio es el nuestro, pero que a la vez tenemos que estar atentos a la red de tradiciones que encuentran su propio espacio”. ¿Tú qué opinas?

Pensamos da mesma forma, porém há a grave questão do idioma em relação ao Brasil. A maior parte dos países em nossa região fala Espanhol. Apenas o Brasil fala Português. Tenho encontrado na região uma certa má vontade em relação ao nosso idioma por parte de escritores  falantes do Espanhol. Parece que desejam ignorar que o Galego, do qual se originou o Português, e o próprio Português são como idiomas da Península Ibérica muito mais antigos e mais abonados literariamente do que o idioma imperialista de Castela. Parece que desejam ignorar também que nem mesmo a brutalidade do regime do Generalíssimo Franco, no século XX, conseguiu extinguir na Espanha o Galego e o Catalão, idiomas mais próximos do Português que o Espanhol de Castela? Digo-te isto porque já me disseram falantes de Espanhol que o ideal é que o Brasil passe a falar Espanhol. Ou seja, querem voltar ao mesmo imperialismo idiomático de Castela na Península Ibérica? Creio que Ricardo Piglia abriu espaço para que se tenha em mente a “rede de tradições que encontram seu próprio espaço”. De parte a parte terá de haver esforço e tentativas sérias de buscarmos conhecer-nos como países e como tradições uns aos outros.

 En nuestros días se está dando un fenómeno muy extraño: Regiones  como Argentina y Brasil, en plena crisis económica, están demostrando una vitalidad cultural muy fuerte. El también argentino Juan José Saer sostenía que pasa esto porque “la cultura no es una válvula de escape sino una tabla de salvación”.  Quisiera conocer tu punto de vista al respecto.

Eu diria que a cultura é mais um meio de afirmação, um caminho, um  horizonte. Principalmente em época de crise, criar cultura também é um modo de ação e até de luta: às vezes, o único modo possível. Aprendemos isto no Brasil e na Argentina, creio, para conseguirmos sobreviver aos anos de chumbo das ditaduras  militares, algo muito pior do que uma crise econômica.

En el campo de las relaciones culturales entre la metrópolis y las antiguas colonias se está dando, en el ámbito de habla hispana, una situación paradójica: España tiene las grandes editoriales, las grandes productoras, las salas de arte importantes (en resumen el dinero) y los países de América Latina la vitalidad cultural. Esto lleva muchas veces, por lógica, a la práctica abusiva. ¿Cuál es la relación, en el mundo cultural, entre Portugal y Brasil?

A relação é diferente, pois o Brasil tem infinitamente mais recursos que Portugal. Peço-te lembrares de que as maiores economias latinoamericanas são Brasil, México e Argentina, sendo que o Brasil é o único a ter expressivas indústrias na área de informática, aeronáutica e militar, sendo o maior produtor de aço, alumínio, cimento, automóveis, álcool  e, em breve, de petróleo e gás, além  de ser um dos maiores produtores mundiais de alimentos. Dependendo da fonte e do autor, embora o Brasil seja o campeão da desigualdade social, ele e´ considerado estar entre a 16a. e a 21a. economias mundiais. Desta forma, a relação entre meu país é Portugal é mais igual, pendendo a balança às vezes em favor do Brasil . O mais importante prêmio literário no mundo da lusofonia é o Prêmio Camões, atribuído a cada ano, alternadamente, a um autor português e a um autor brasileiro, por meio de um júri internacional de alto relevo. Há casos de livros de escritores lusitanos com tiragens brasileiras muito maiores que as verificadas em sua pátria de origem. O Gabinete Português de Leitura, mantido pela colônia portuguesa, é uma instituição que existe em várias das grandes cidades brasileiras, dispondo sempre de uma boa biblioteca e quase sempre editando uma revista literária em que comparecem autores dos dois países.

Brasil e Portugal estão atentos à questão da lusofonia em África (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe) e na Ásia, mormente em Timor Leste e no ex-enclaves Macau (China) e Goa (Índia)

Estoy notando que en América Latina a los escritores les cuesta unirse, en cada uno de sus países, para dar una respuesta coherente a la sociedad de consumo que tanto mal les hace. ¿Por qué están los escritores latinoamericanos tan desunidos entre sí?

Cada país é um caso. Não podemos generalizar, pois na região há países com níveis muito diferentes de desenvolvimento econômico, social, político e cultural. Também,  há diferentes tradições em jogo. Como sabemos que o escritor pertence geralmente aos quadros das classes médias (ou pequena burguesia), temos de levar em  conta o individualismo inerente à sua classe de origem bem como a sua provável alienação em termos políticos. Além do mais, em cada país os escritores competem uns com os outros nas editoras, na mídia, nas premiações, nas vagas das academias de prestígio. Os gregos antigos já faziam os poetas competir nas Olimpíadas.  São dignos de menção os escritores que conseguem compreender a     função social da literatura, uma função tão nobre quanto as demais que lhe são inerentes. A maioria dos escritores, infelizmente, adota as posições do egoísmo e  do beletrismo, ou seja, da torre de marfim (“sou um artista e o resto que se dane!”)

La realidad es bastante negativa, pero pese a todos los males y pesares, los integrantes de Malabia somos optimistas en cuanto al futuro. Sobre todo porque somos testigos, gracias a la revista, de la enorme cantidad de talento que existe en el mundo. Pensamos que el día que ese talento se pueda usar para la mejora de la humanidad, el ser humano puede alcanzar grandes cimas. ¿Tú qué piensas?

Sim, claro. Ainda falta muito para se chegar lá. No entanto, é possível abreviar o tempo. O escritor pode e deve colaborar para a melhora possível (os homens jamais serão anjos, porque trazem o animal em sua natureza) da humanidade. No entanto, antes de pensar e de ler, o homem tem de se alimentar, no que se vê que a obrigação maior é de cada governo nacional que deveria investir em educação, cultura, saúde, saneamento básico, moradia e transportes públicos, além de políticas que  possibilitem criar empregos e alimentos disponíveis.

Me gustaría terminar preguntándote por tus proyectos futuros.

Inicialmente, concluir logo e lançar meu livro de poesia “Menos que os  Nomes de Tudo”, o qual continuará o ciclo iniciado com “Mais que os Nomes do Nada”. Escrever a história de importantes revistas e jornais literários brasileiros do século XX, dos quais já estão prontos e publicados os textos referentes à revista “Dimensão” (Museu/Arquivo da Poesia Manuscrita, Florianópolis, 2000) e ao jornal “Poiésis” (“O Escritor – Jornal da União Brasileira de Escritores” nº 110, São Paulo, junho 2005). Prosseguir trabalhando para a Enciclopédia de Literatura Brasileira. Continuar colaborando com programas de ONG’s (Organizações Não Governamentais) dedicados a crianças carentes, meninos de rua e pessoas idosas desassistidas.

 

 

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